22/11/18

Mesa de Café

Ele olhava pela janela do café. Gente igual a tanta gente. De vez em quando, deitava o olhar sobre o jornal, mas nada de interesse lhe prendia a atenção. Parecia alheio a tudo e a todos.

Levanta a cabeça e vê-a. Os seus olhares se cruzam como se fosse a coisa mais natural do mundo. Mas não foi. Sentiu naquele olhar algo mais que um simples olhar. Levantou-se e dirigiu-se para a mesa onde um cheiro de mulher lhe adoçava os sentidos. Pega na mão dela e junta-a às suas.

Inicialmente sente um certo retraimento, mas aquele mesmo gesto parecia que já tinha sido feito há muito tempo e que, afinal, aquelas mãos já se conheciam de outras eras.

Lá fora, o frio de novembro apressava os passos de quem, ao fim do dia, se dirigia para casa.

Olhos nos olhos, mãos nas mãos, só eles não tinham pressa, como desejando que aquele momento fosse eterno.

Mas nada é eterno!

17/09/18

O Falo

(tema dedicado a São Rosas)

Passava longas noites acordada. Algo tinha mexido com o seu espírito, com o seu estado de alma. Não sabia a razão porque acordava com pensamentos lúbricos, como se algo lhe faltasse naquela relação a dois que mantinha com homem que a seu lado dormia. O sonho era sempre com algo grande, algo que a penetrasse, que a rasgasse, não como antecâmara da morte, mas sim como o prazer da vida.

Na praia olhava para os outros homens. Mirava os casais e a atrapalhação de alguns machos quando o seu corpo roçava nem que fosse ao de leve, com aquelas formas estonteantes que se encostavam ao seu corpo. Elas ou se apercebiam do facto e olhando sorriam como brincando com a sua masculinidade ou, na maior parte das vezes, nem disso se apercebiam.

As ondas iam e vinham. Ora grandes, ora pequenas. O seu olhar deambulava por aquelas falésias perigosas onde as pessoas sem terem noção disso, ali procuravam sombra. Quando um dia cair um pedregulho em cima, terão a sombra completa.

O corpo a seu lado, dormitava. Levantou-se, olhou para o mar. Algures a Atlântida tinha-se afundado mas, no seu interior, as Amazonas continuavam a fazer dessa Atlântida o seu paraíso. A chefe guerreira, procurava homens para a satisfazer durante o tempo que lhe durasse o desejo do libido, e quando deles se cansava, seria mais um a fazer parte de um silo incrustado na parede, onde, empalhados, outros homens ali jaziam.

Sentia-se uma delas, guerreira e rebelde. Só num dos casos era bom não o ser, não se estava a ver com um seio direito mutilado para melhor uso do arco e da lança. Que Ártemis lhe perdoasse, mas isso nunca seria capaz de o fazer.

Os seus passos dirigiam-se abstratos da Praia dos 3 Castelos em direção à praia do Alemão. Ia São Rosas absorta nos seus pensamentos quando, olhando para uma falésia, viu o seu sonho ali bem vincado. Um grande falo estava em frente dos seus olhos. Por ali tinha passado numa deambulação anterior e essa imagem tinha-lhe ficado gravado inconscientemente no seu cérebro. Nunca tinha visto uma coisa assim e nunca iria ver. Coisas da natureza que dão imagens destas, que cada um interpreta à sua maneira ou não interpreta de maneira nenhuma.

Contemplou mais uma vez o seu "sonho" e, devagarinho como se não quisesse desfazer-se dele, voltou para trás. Deitou-se ao lado do homem que ainda dormitava e, colocando-lhe o braço por cima, agradeceu o facto de ele ter algo mais pequenino mas, que no fundo, fazia parte da sua felicidade.

Os olhos fecharam-se e nada mais veio perturbar o seu espírito.